A estabilidade da gestante e a superação da Súmula 244 do TST
Elaborado em 08/2012.
Em recentes julgados,
algumas Turmas do TST afastaram a aplicação da Súmula 244 para o fim de
conceder a estabilidade gestacional às empregadas admitidas por contrato a
prazo determinado.
INTRODUÇÃO
O artigo 7º da
Constituição Federal de 1988 estabelece um patamar mínimo de direitos
destinados à melhoria da condição social dos trabalhadores urbanos e rurais.
Dentre tais direitos, encontra-se o direito à relação de emprego protegida
contra dispensa arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar,
que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.
Por se tratar de norma
dependente de posterior regulamentação, o Constituinte Originário fez incluir
no artigo 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias- ADCT, previsão no sentido de que, até que seja promulgada a lei
complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição Federal, é vedada a
dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a
confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
Trata-se de importante
instrumento de proteção à vida que está por vir. De igual modo, significa a
garantia de subsistência da mãe durante o período inicial de vida da criança.
Assim, a Constituição Federal pretende proteger a mãe e a criança.
Instando a se manifestar
quanto à compatibilidade entre a estabilidade conferida à empregada gestante e
os contratos a prazo determinado, o Tribunal Superior do Trabalho editou a
Súmula 244, a
qual, no inciso III, dispõe que não há direito da empregada gestante à
estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de
experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do
prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.
O Supremo Tribunal
Federal, por sua vez, ao interpretar a norma constitucional transitória firmou
posicionamento no sentido de que o artigo 10, inciso II, alínea “b”, do ADCT,
assegura à empregada gestante a estabilidade provisória de até cinco meses após
o parto, independentemente do regime jurídico a elas aplicável.
Sensíveis aos fins
sociais a que se destina a garantia destinada à empregada gestante, bem como à
consolidada jurisprudência do STF, algumas Turmas do TST, passaram a afastar a
aplicação do disposto no inciso III da Súmula 244 do TST.
Trata-se do início da
superação do inciso III da Súmula 244, em busca da maior efetividade do Texto
Constitucional. No entanto, referida mudança de posicionamento tem encontrando
resistência por parte de algumas Turmas do TST, as quais, em recentes julgados,
têm aplicado o disposto na Súmula 244.
1 – A Estabilidade
Gestacional na Constituição Federal de 1988.
A República Federativa
do Brasil, constituída em
Estado Democrático de Direito, tem por fundamento a dignidade
da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, a cidadania,
a soberania e o pluralismo político. Trata-se de Estado Democrático destinado a
assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, estabelecida
na harmonia social.
Nos termos do artigo 6º
da Carta Maior, o ser humano apresenta-se como destinatário dos direitos
sociais, os quais foram estabelecidos como sendo a educação, a saúde, a alimentação,
o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.
Os direitos sociais, aí
incluídos os de índole trabalhista, são direitos fundamentais do homem,
caracterizando-se como liberdades positivas, as quais são de observância
obrigatória pelo Estado. Têm por finalidade a melhoria das condições de vida
dos hipossuficientes, visando à materialização da igualdade social. Nas
palavras de José Afonso da Silva, “são direitos que se ligam ao direito de
igualdade”1.
Por outras palavras, são
direitos destinados à proteção das necessidades básicas do ser humano, para que
viva com o mínimo de dignidade e com acesso aos bens materiais e morais
condicionadores da sua realização enquanto cidadão.
Sob a ótica da pessoa
que vive do trabalho, em especial do trabalho empregatício, os direitos sociais
são o principal instrumento de concretização dos princípios e regras constitucionais referentes à prevalência da
dignidade da pessoa, da valorização do trabalho e do emprego, da submissão da
propriedade privada a sua função social, da efetividade da justiça social e da
democratização da sociedade civil2.
Do exposto, é possível
extrair o especial destaque dado pelo Constituinte Originário ao primado do
trabalho humano (art. 193, CF/1988), o qual foi reconhecido como condição de
efetiva existência digna.
Segundo as lições de
Jorge Luiz Souto Maior "o trabalho é da essência humana, no sentido de
dever de valorização pessoal e de integração social, e será ao mesmo tempo um
dever e um direito, na relação do indivíduo com a sociedade e o Estado”.3
A esse respeito, Luciano
Martinez4 destaca que indicar que o trabalho é um valor de caráter
social significa dizer que é um direito social fundamental (art. 6, CF/1988),
“sem o qual não se movimentam as estruturas do Estado, sem o qual não se
admitem o crescimento econômico e a saúde política de uma sociedade”.
O trabalho é valorizado
a tal ponto que teve a essencialidade da conduta laborativa reconhecida pela
Constituição Federal como um dos instrumentos mais relevantes de afirmação do
ser humano, seja no contexto da própria individualidade, seja no contexto de
sua inclusão familiar e social. Constitui-se em um especial veículo de
afirmação comunitária da grande maioria das pessoas que compõem a contemporânea
sociedade capitalista.
Trata-se de um direito e
de um honroso dever do ser humano.
Não por outro motivo, a
estabilidade do trabalhador no emprego foi um dos temas que maior controvérsia
gerou na Assembleia Nacional Constituinte que resultou na promulgação do atual
Texto Maior. Significativas organizações sindicais e Partidos Políticos
lograram êxito, ainda no seio da Comissão da Ordem Social, na aprovação de
disposições assegurando a estabilidade no emprego com restrições significativas
à administração empresarial.5
Posteriormente, na
Comissão de Sistematização, devido a pressões exercidas por empresários e
alguns setores governamentais, a estabilidade anteriormente prevista foi
substituída pela garantia de uma indenização compensatória, além de outros
mecanismos, tais como fundo de garantia por tempo de serviço, o seguro
desemprego e o aviso prévio proporcional.
Em razão da substituição
da estabilidade no emprego, foi estabelecida regra no Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias (art. 10, inciso I) fixando o valor da indenização
até que a lei prevista no art. 7º, I, da Constituição Federal, seja aprovada.
Da mesma forma, foi estabelecida regra tornando inválida a dispensa arbitrária
ou sem justa causa do empregado eleito para cargo de direção de comissões
internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um
ano após o final de seu mandato, bem como da empregada gestante, desde a
confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, inciso II,
ADCT).
Nesse ponto, especial
destaque merece a proteção conferida à empregada gestante, desde a confirmação
da gravidez até cinco meses após o parto.
Trata-se, inegavelmente,
de expressiva garantia de caráter social, cujo gozo depende somente da
confirmação objetiva do estado gravídico da empregada, independentemente de sua
prévia comunicação ao empregador ou mesmo da modalidade contratual celebrada
entre as partes envolvidas no vínculo empregatício.
Quer-se dizer, com isso,
que o único requisito exigido pelo Constituinte é a confirmação da gravidez. A
estabilidade gestacional não se encontra condicionada à prévia comunicação do
estado gravídico ao empregador ou mesmo à celebração de um contrato de trabalho
a prazo indeterminado. Exigiu-se apenas a confirmação da gravidez.
A previsão
constitucional, para fins de concessão da estabilidade à empregada gestante,
não estabeleceu distinção entre contratos a prazo determinado ou indeterminado.
O que se pretende proteger é a vida que está por vir, é a garantia de
subsistência da mãe durante o período inicial de vida do novo ser. A
Constituição Federal protege a mãe e o nascituro.
A garantia
constitucional ultrapassa o interesse estrito da empregada gestante, uma vez
que possui manifestos fins de saúde e de assistência social não somente em
relação às mães trabalhadoras como também em face de sua gestação e da criança
recém-nascida.6
Não bastasse isso, não
se pode olvidar que o intérprete deve atribuir à norma constitucional o sentido
que lhe dê maior eficácia, a mais ampla efetividade. Por outras palavras, em
caso de dúvida, deve-se preferir a interpretação que maior efetividade confira
à norma constitucional.
Desse modo, o artigo
art. 10, inciso II, b, do ADCT, deve ser interpretado da forma que maior
efetividade lhe seja concedida, o que, por consequência, resultará em uma
proteção mais concreta à empregada gestante e ao nascituro, afastando-se
condicionantes não previstas no Texto Constitucional.
3 - A estabilidade da
gestante e os contratos a prazo determinado. A Súmula 244 do TST.
Por se tratar de um
importante limitador do poder empregatício assegurado ao empregador e de um
instrumento destinado à proteção dos direitos dos trabalhadores, as
estabilidades provisórias, de um modo geral, sempre mereceram especial atenção
dos juristas.
Especificamente quanto à
estabilidade gestacional, o Tribunal Superior do Trabalho, por intermédio da
Sumula 244, consolidou entendimento no sentido de que o termo final dos
contratos de trabalho a prazo determinado não é protraído em virtude da
aquisição da estabilidade ora discutida. O que a estabilidade provisória
impediria é a dispensa imotivada e não o término natural do contrato de
trabalho, o qual não traduziria a ideia de dispensa.
Súmula nº 244 do TST
GESTANTE. ESTABILIDADE
PROVISÓRIA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 88 e 196 da
SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
I - O desconhecimento do
estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da
indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT).
(ex-OJ nº 88 da SBDI-1 - DJ 16.04.2004 e republicada DJ 04.05.04)
II - A garantia de
emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período
de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais
direitos correspondentes ao período de estabilidade. (ex-Súmula nº 244 –
alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)
III - Não há direito da
empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante
contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do
término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa. (ex-OJ
nº 196 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000)
Ao tratar da Súmula 244
do TST, acima reproduzida, Bruno Klippel7, leciona que:
“Apesar de o
entendimento do TST versar apenas sobre o contrato de experiência, espécie de
contrato a prazo determinado, descrito no artigo 443 da CLT, a ideia deve ser
aplicada a qualquer espécie desses contratos, pois a predeterminação do prazo
já torna a dispensa totalmente lícita, pois quando da contratação a empregada
já sabia da data de seu término. Assim, sabia que, independentemente da
superveniência de gravidez, o vínculo trabalhista terminaria em uma data
certa”.
No mesmo sentido,
Aldemiro Rezende Dantas Júnior8 ensina que “a ocorrência de uma das
causas de garantia de emprego, no curso do contrato a termo, não assegura a
continuidade do contrato, que se extinguirá normalmente no término previsto”.
Segundo o mesmo autor, “em relação à gestante, esclarece a Súmula 244, do TST,
que não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese
de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação
de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou
sem justa causa”.
Em que pese o
entendimento sumulado pelo TST, tem-se verificado, no âmbito do próprio TST,
uma mudança de entendimento no sentido de assegurar à empregada gestante a
completa estabilidade assegurada pelo Texto Maior, ainda que tenha sido
contratada por intermédio de um contrato a prazo determinado.
4 – Tribunal Superior do
Trabalho: a superação da Súmula 244
Com o intuito de
conferir maior efetividade ao Texto Constitucional, bem como se adequar à consolidada
jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, algumas Turmas do Tribunal
Superior do Trabalho têm repensado o entendimento consolidado por intermédio da
Súmula 244 do TST. Em recentes julgados, afastou-se a aplicação da Súmula para
o fim de conceder a estabilidade gestacional às empregadas admitidas por
intermédio de um contrato a prazo determinado.
A nova diretriz
jurisprudencial pretende resguardar a subsistência da mãe e da criança que está
por vir. Além disso, ostenta manifestos fins assistenciais e de saúde não
somente em relação à mãe trabalhadora como também em face de sua gestação e da
criança recém-nascida.
Maurício Godinho Delgado9,
ao tratar da estabilidade da gestante nos contratos a termo, leciona que:
“Havendo, desse modo,
evidente interesse público com vistas às proteções à mãe trabalhadora, sua
gestação e o parto, além do período inicial da maternidade, interesse público
que se pretende também à criança nascitura, ganha destaque a garantia
constitucional, afastando o óbice criado pela Consolidação das Leis do Trabalho
com respeito aos contratos a termo (art. 472, §2º, CLT).”
Nessa ordem de ideias,
cumpre citar trecho do Voto proferido pelo Ministro Celso de Mello, no
julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 634.093/Distrito
Federal:
“Em suma: as gestantes –
quer se trate de servidoras públicas, quer se cuide de trabalhadoras, qualquer
que seja o regime jurídico a elas aplicável, não importando se de caráter
administrativo ou de natureza contratual (CLT), mesmo aquelas ocupantes de
cargo em comissão ou exercentes de função de confiança ou, ainda, as
contratadas por prazo determinado, inclusive na hipótese prevista no inciso IX
do art. 37 da Constituição, ou admitidas a título precário – têm direito
público subjetivo à estabilidade provisória, desde a confirmação do estado
fisiológico de gravidez até cinco (5) meses após o parto (ADCT, art. 10, II,
“b”), e, também, à licença-maternidade de 120 dias (CF, art. 7º, XVIII, c/c o
art. 39, § 3º), sendo-lhes preservada, em consequência, nesse período, a
integridade do vínculo jurídico que as une à Administração Pública ou ao
empregador, sem prejuízo da integral percepção do estipêndio funcional ou da
remuneração laboral.
O Supremo Tribunal
Federal possui consolidada jurisprudência no sentido de assegurar à gestante a
estabilidade provisória prevista no artigo 10, inciso II, alínea b, do ADCT,
conforme recentes arestos a seguir reproduzidos:
EMENTA Agravo regimental
no recurso extraordinário. Servidora gestante. Cargo em
comissão. Exoneração. Licença-maternidade. Estabilidade
provisória. Indenização. Possibilidade. 1. As servidoras públicas, em estado
gestacional, ainda que detentoras apenas de cargo em comissão, têm direto à
licença- maternidade e à estabilidade provisória, nos termos do art. 7º, inciso
XVIII, c/c o art. 39, § 3º, da Constituição Federal, e art. 10, inciso II,
alínea b, do ADCT. 2. Agravo regimental não provido. (RE 420839 AgR,
Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 20/03/2012, ACÓRDÃO
ELETRÔNICO DJe-081 DIVULG 25-04-2012 PUBLIC 26-04-2012)
AGRAVO REGIMENTAL NO
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. SERVIDORA
GESTANTE. EXONERAÇÃO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. 1. As servidoras
públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário,
independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à
licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a
confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Precedentes: RE n. 579.989-AgR,
Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Dje de 29.03.2011, RE
n. 600.057-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, Dje de 23.10.2009
e RMS n. 24.263, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de
9.5.03. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AI 804574 AgR,
Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 30/08/2011, DJe-178
DIVULG 15-09-2011 PUBLIC 16-09-2011 EMENT VOL-02588-03 PP-00317 RT v. 100, n.
913, 2011, p. 491-494)
EMENTA: AGRAVO
REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDORAS PÚBLICAS E EMPREGADAS
GESTANTES. LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 7º, XVIII, DA
CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, "B", do ADCT. O Supremo Tribunal Federal
fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas
gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do
regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte
dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição do Brasil e
do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE
600057 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 29/09/2009,
DJe-200 DIVULG 22-10-2009 PUBLIC 23-10-2009 EMENT VOL-02379-10 PP-02124)
Consoante noticiado
linhas acima, algumas Turmas do Tribunal Superior do Trabalho passaram a seguir
o entendimento jurisprudencial consolidado na Corte Maior, o que pode ser
apreendido a partir da leitura dos arestos abaixo reproduzidos:
RECURSO DE REVISTA -
GESTANTE - ESTABILIDADE PROVISÓRIA - CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. Estabelece o art.
10, II, "b", do ADCT/88 que é vedada a dispensa arbitrária ou sem
justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto, não impondo nenhuma restrição quanto à modalidade de
contrato de trabalho, mesmo porque a garantia visa, em última análise, à tutela
do nascituro. O entendimento vertido na Súmula nº 244, III, do TST encontra-se
superado pela atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de
que as empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário,
independentemente do regime de trabalho, têm direito à licença maternidade de
120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto. Dessa orientação dissentiu o acórdão recorrido, em afronta
ao art. 10, II, -b-, do ADCT/88. Recurso de revista conhecido e provido. (RR -
1520-32.2010.5.04.0511, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho,
Data de Julgamento: 27/06/2012, 4ª Turma, Data de Publicação: 03/08/2012)
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE
DA GESTANTE. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. Demonstrado que a decisão regional
viola, em princípio, o art. 10, II, b, do ADCT, dá-se provimento ao agravo de
instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de
instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE DA GESTANTE. CONTRATO
POR PRAZO DETERMINADO. NORMATIZAÇÃO ESPECIAL E PRIVILEGIADA À MATERNIDADE
CONTIDA NA CARTA DE 1988. ARTS. 10, II, B, DO
ADCT, ARTS. 7º, XVIII E XXII, 194, 196, 197, 200, I, 227, CF/88. RESPEITO, FIXADO NA
ORDEM CONSTITUCIONAL, À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, À PRÓPRIA VIDA AO NASCITURO
E À CRIANÇA (ART. 1º, III, E 5º, CAPUT, DA CF). Em princípio, a lógica dos
contratos a termo não permite qualquer possibilidade de maior integração do
trabalhador na empresa, além de já preestabelecer o final do próprio vínculo
empregatício. Em face disso, em regra, o instituto da garantia de emprego é
inábil a produzir, no contexto dos contratos a termo, a mesma extensão de
efeitos que seguramente propicia na seara dos contratos indeterminados. Por
outro ângulo, contudo, é certo dizer que a lógica dos contratos a termo é
perversa e contra ela se contrapõe todo o Direito do Trabalho, já que esse ramo
jurídico especializado busca aperfeiçoar as condições de pactuação da força de
trabalho no mercado. Por essas razões, a legislação busca restringir ao máximo
suas hipóteses de pactuação e de reiteração no contexto da dinâmica
justrabalhista. Note-se que a CLT não prevê a situação da gravidez como
situação excepcional a impedir a ruptura contratual no contrato a termo. Contudo
o art. 10, II, do ADCT da Constituição, em sua alínea b, prevê a estabilidade
provisória à -empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto-. Estipula, assim, a vedação à dispensa arbitrária ou sem
justa causa. Ressalte-se que a maternidade recebe normatização especial e
privilegiada pela Constituição de 1988, autorizando condutas e vantagens
superiores ao padrão deferido ao homem - e mesmo à mulher que não esteja
vivenciando a situação de gestação e recente parto. É o que resulta da leitura
combinada de diversos dispositivos, como o art. 7º, XVIII (licença à gestante
de 120 dias, com possibilidade de extensão do prazo, a teor da Lei 11.770/2008,
regulamentada pelo Decreto 7.052/2009) e das inúmeras normas que buscam assegurar
um padrão moral e educacional minimamente razoável à criança e ao adolescente
(contidos no art. 227, CF/88, por exemplo). De par com isso, qualquer situação
que envolva efetivas considerações e medidas de saúde pública (e o período de
gestação e recente parto assim se caracterizam) permite tratamento normativo
diferenciado, à luz de critério jurídico valorizado pela própria Constituição
da República. Note-se, ilustrativamente, a esse respeito, o art. 196 que firma
ser a saúde -direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros
agravos...-; ou o art. 197, que qualifica como de -relevância pública as ações
e serviços de saúde...-, além de outros dispositivos, como artigos 194, 200, I,
e 7º, XXII, CF/88. A estabilidade provisória advinda da licença maternidade
decorre da proteção constitucional às trabalhadoras em geral e, em particular,
às gestantes e aos nascituros. A proteção à maternidade e à criança advém do
respeito, fixado na ordem constitucional, à dignidade da pessoa humana e à
própria vida (art. 1º, III, e 5º, caput, da CF). E, por se tratar de direito
constitucional fundamental, deve ser interpretado de forma a conferir-se, na
prática, sua efetividade. Nesse sentido, entendo que não pode prevalecer o
posicionamento adotado pelo TRT, que conferiu preponderância aos efeitos dos
contratos a termo - especificamente em relação à garantia de emprego - em
detrimento da estabilidade assegurada às gestantes, na forma do art. 10, II, b,
do ADCT. Nessa linha, está realmente superada a interpretação exposta no item
III da Súmula 244 do TST. Inclusive o Supremo Tribunal Federal possui diversas
decisões - que envolvem servidoras públicas admitidas por contrato temporário
de trabalho -, em que expõe de forma clara o posicionamento de garantir à
gestante o direito à licença-maternidade e à estabilidade, independentemente do
regime jurídico de trabalho. Sob esse enfoque, o STF prioriza as normas
constitucionais de proteção à maternidade, lançando uma diretriz para
interpretação das situações congêneres. Recurso de revista conhecido e provido.
(RR - 21700-25.2009.5.01.0079, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data
de Julgamento: 08/02/2012, 6ª Turma, Data de Publicação: 13/04/2012).10
No entanto, algumas Turmas do
Tribunal Superior do Trabalho, em recentes julgamentos, ainda têm dado plena
aplicabilidade ao inciso III da Súmula 244, no sentido de negar o direito à
estabilidade gestacional quando a contratação se der por intermédio de contrato
de experiência11.
CONCLUSÃO
A necessidade de
proteção social destinada ao trabalhador, além de ser a raiz sociológica do
Direito do Obreiro, é inerente a todo o seu sistema jurídico baseado no primado
do princípio protetor.
O conteúdo humano
existente no Direito do Trabalho obriga o jurista a ir além das discussões
formais e a ver, por detrás dos argumentos jurídicos, a luta dos homens. Como
nessa luta o empregado ocupa a posição mais vulnerável, a valoração da norma
que disciplina a matéria tende a ser mais favorável ao obreiro.
Desse modo, as normas
devem ser interpretadas com base nos seus fins sociais e nas exigências do bem
comum. Devem ser adaptadas à realidade e necessidade sociais, às razões sociais
motivadoras de sua elaboração.
Não se pode olvidar que
as normas infraconstitucionais devem ser interpretadas com base nas disposições
encartadas na Constituição Federal, cujas disposições devem nortear a aplicação
e elaboração da legislação infraconstitucional. Em caso de dúvida quanto a qual
sentido conferir à norma, deve-se preferir a interpretação que maior
efetividade confira à norma constitucional.
Assim sendo, especial
destaque merece a estabilidade provisória prevista no artigo 10, inciso II,
alínea “b”, do ADCT, por destinar à empregada gestante uma significativa
garantia de caráter social, veículo de proteção à vida que está por vir e
garantia de subsistência da mãe durante o período inicial de vida do novo ser.
Protege-se, com isso, a mãe e o nascituro.
A partir da análise da
Lei Maior, verifica-se que a garantia constitucional em análise está
condicionada somente à confirmação da gravidez. O Texto Constitucional não
condicionou o gozo da estabilidade à pactuação de um contrato de trabalho a
prazo indeterminado. Assim, é inválida a dispensa arbitrária ou sem justa causa
da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o
parto, ainda que contratada por intermédio de contrato a prazo determinado.
Nesse
contexto, a mudança de entendimento adotada por algumas Turmas do Tribunal
Superior do Trabalho, seguindo posicionamento já consolidado no Supremo
Tribunal Federal, mostra-se respeitável, por conferir uma maior efetividade à
norma constitucional que assegura à gestante a estabilidade provisória, desde a
confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
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Notas
1 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito
Constitucional Positivo. 30ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 286 –
287.
2 DELGADO, Maurício Godinho. Constituição da
República, Estado Democrático de Direito e Direito do Trabalho in Revista LTR
Legislação do Trabalho. Ano 75, Vol. 10. Outubro de 2011. São Paulo, p. 1168.
3 MAIOR, Jorge Luiz Souto apud DELGADO, Gabriela
Neves. A Centralidade do Trabalho Digno na Vida Pós-Moderna. DVD Magister:
Conteúdo Jurídico Brasileiro. Porto Alegre: Editora Magister, 2010, vol. 34
(out./nov. 2010)
4 MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do
Trabalho. São Paulo:
Saraiva, 2010, p.443.
5 SUSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do
Trabalho. 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 126.
6 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do
Trabalho. 11ª Edição, São Paulo: LTR, 2012, p. 547.
7 KLIPPEL, Bruno. Direito Sumular Esquematizado
– TST. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 307-308.
8 DANTAS JÚNIOR, Aldemiro Rezende. Curso de
Direito do Trabalho. 3ª Edição. Manaus, 2009, p. 133.
9 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do
Trabalho. 11ª Edição, São Paulo: LTR, 2012, p. 547.
10 No mesmo sentido: TST -
RR-1601-11.2010.5.09.0068, 1ª Turma, Rel. Min. Vieira de Mello Filho, in DJ
9.3.2012; TST - RR- 57041-60.2009.5.09.0671 Ac. 3ª Turma, Redator Min Horácio
Raymundo de Senna Pires, 3ª Turma, in DEJT 27.4.2012; TST - RR -
186700-33.2008.5.12.0006, Relator Ministro: Pedro Paulo Manus, Data de
Julgamento: 13/06/2012, 7ª Turma, Data de Publicação: 15/06/2012;
11 Nesse sentido: TST - RR -
240-10.2011.5.04.0020, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data
de Julgamento: 20/06/2012, 2ª Turma, Data de Publicação: 29/06/2012; TST - RR -
272800-78.2009.5.02.0088, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, Data de
Julgamento: 14/03/2012, 2ª Turma, Data de Publicação: 23/03/2012; TST - AIRR -
542-77.2010.5.02.0263, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de
Julgamento: 25/04/2012, 8ª Turma, Data de Publicação: 27/04/2012.